
Durante anos, o foco do combate à violência doméstica esteve voltado, e com razão, para as mulheres. No entanto, um novo inquérito oficial lança luz sobre uma realidade muitas vezes ignorada: quase metade dos homens angolanos entre os 15 e os 49 anos sofreu violência doméstica entre 2023 e 2024. Os números surpreendem e abrem espaço para um debate sensível e urgente sobre masculinidade, dor silenciada e igualdade na protecção das vítimas.
De acordo com dados do Inquérito de Indicadores Múltiplos e de Saúde (IIMS), divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) em parceria com o Ministério da Estatística e Planeamento, cerca de 48% dos homens angolanos relataram ter sido alvo de agressões físicas cometidas pelas suas companheiras ou ex-companheiras.
Embora o índice de violência contra as mulheres continue mais elevado – registando 56% no mesmo período –, o número de homens vítimas desafia o estigma cultural que frequentemente os impede de denunciar ou até reconhecer o abuso. A vergonha, o preconceito social e a falta de políticas inclusivas contribuem para o silenciamento desses casos.
O relatório revela ainda que cerca de um quarto dos homens entrevistados enfrentaram agressões vindas de ex-companheiras, mostrando que o ciclo de violência muitas vezes ultrapassa o fim da relação.
Quando se analisa o dado total da população masculina entre os 15 e os 49 anos, 29% afirmaram já ter sido agredidos desde essa idade. E, apenas nos 12 meses que antecederam o inquérito, 22% disseram ter sido vítimas de violência doméstica.
Organizações de defesa dos direitos humanos e especialistas em saúde mental defendem que a violência não deve ter género. A inclusão dos homens nas políticas de protecção é vista como essencial para combater o fenómeno de forma justa e eficaz. Ao mesmo tempo, sublinha-se que a luta contra a violência doméstica não é uma competição entre géneros, mas uma batalha por dignidade, segurança e justiça para todos.