Embora o objectivo original do Orçamento do Munícipe seja promover obras sociais e melhorar as condições de vida das comunidades, a sua aplicação em Angola tem levantado questionamentos sobre transparência e eficácia. Na prática, o programa tem sido utilizado como uma solução temporária para suprir deficiências estruturais do Estado, com ações como troca de lâmpadas, reparação de pontes e manutenção de escolas, atividades que deveriam ser responsabilidade direta das instituições públicas.
Segundo o regulamento, o Orçamento do Munícipe consiste numa verba alocada pelo Orçamento Geral do Estado (OGE), destinada para que os cidadãos decidam de forma democrática os procjetos a serem implementados em suas localidades. Contudo, há uma diferença entre este orçamento e o Orçamento Participado da Administração Municipal, que é gerido diretamente pelas administrações municipais.
Para o ano de 2025, a proposta do OGE prevê uma alocação de mais de 4,06 mil milhões de Kz para serem distribuídos entre os 326 municípios do país, resultando numa média de 12,5 milhões Kz por município. Esse valor é consideravelmente inferior aos 25 milhões Kz estabelecidos pelo decreto presidencial n.º 234/19, de 22 de julho, que regulamenta o programa.
Os recursos previstos devem ser aplicados em áreas como iluminação pública, manutenção de áreas verdes e limpeza urbana, obras de saneamento básico, centros comunitários, atividades culturais e bibliotecas municipais. No entanto, a realidade é que muitos projetos acabam sendo desviados para atender necessidades básicas, como a compra de alimentos e roupas para famílias vulneráveis, expondo a falência de programas estruturantes como o Programa Integrado de Desenvolvimento Local e Combate à Pobreza (PIDLCP).
Impacto Social Limitado
Nos últimos anos, o Orçamento do Munícipe tem refletido as condições precárias de várias localidades, sendo utilizado para mitigar a ausência de serviços essenciais de saúde, educação e saneamento. Segundo Luíz Jimbo, diretor do Instituto Angolano de Sistemas Eleitorais e Democracia (IASED), a falta de impacto dos programas públicos nas comunidades demonstra a ineficácia das políticas governamentais em resolver problemas estruturais.
“O Orçamento do Munícipe deveria ser uma ferramenta para promover o desenvolvimento participativo e sustentável. No entanto, ele tem sido usado como um recurso emergencial para apagar incêndios, sem proporcionar mudanças significativas na vida dos cidadãos”, afirmou Jimbo.
Além disso, a falta de um processo transparente de escolha dos projetos implementados tem gerado desconfiança entre os munícipes, que muitas vezes não são consultados ou sequer informados sobre a execução das obras.
Desafios e Perspectivas
A realidade enfrentada pelas comunidades que dependem do Orçamento do Munícipe contrasta fortemente com os objetivos declarados pelo governo. Embora a iniciativa tenha potencial para transformar a gestão local, as falhas na aplicação dos recursos e a ausência de fiscalização adequada comprometem o alcance dos resultados esperados.
Organizações da sociedade civil, como o IASED, têm pressionado por uma revisão do programa, enfatizando a necessidade de maior envolvimento das comunidades e de um monitoramento mais rigoroso. Segundo especialistas, apenas uma gestão eficiente e participativa poderá reverter a percepção de que o Orçamento do Munícipe serve mais para mascarar a ineficiência estatal do que para promover o bem-estar social.
Enquanto isso, as comunidades continuam a enfrentar desafios significativos, enquanto o programa luta para cumprir o propósito para o qual foi originalmente concebido.