
Uma decisão polémica do Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos lançou o alarme no seio da comunidade académica internacional: centenas de estudantes estrangeiros, incluindo mais de duas centenas oriundos da África Subsariana, enfrentam agora o risco de expulsão imediata, na sequência de uma ordem que revoga vistos de estudo F-1 e J-1 e impede a Universidade de Harvard de admitir novos alunos estrangeiros para o ano lectivo de 2025/2026.
A medida, entretanto travada provisoriamente por um juiz federal, afectaria, segundo dados revelados pela própria Harvard, cerca de 7.000 estudantes internacionais, dos quais 263 possuem nacionalidades africanas. A ordem de suspensão chegou a Harvard no dia 22 de Maio, levando a universidade a interpor uma acção judicial no dia seguinte, acusando o governo federal de conduta inconstitucional e de perseguição política.
No epicentro do conflito está a recusa da prestigiada instituição em ceder a exigências governamentais relacionadas com o controlo ideológico do seu corpo docente e estudantil. Harvard denuncia o que classifica como uma “retaliação aberta” por parte da administração, na sequência da sua postura crítica relativamente à política externa americana, particularmente ao posicionamento face ao conflito israelo-palestiniano.
A universidade norte-americana acusa o governo de tentar “apagar um quarto do seu corpo estudantil” com uma canetada e de colocar em causa décadas de contribuição dos estudantes internacionais para o progresso académico, científico e económico dos Estados Unidos. A acção judicial apresentada em Massachusets sublinha que estas medidas violam os direitos constitucionais da instituição, nomeadamente os garantidos pela Primeira Emenda, ao liberdade de expressão e de pensamento.
Em paralelo, o secretário de Estado, Marco Rubio, deu instruções às embaixadas norte-americanas para suspenderem entrevistas de emissão de vistos a novos estudantes, exigindo a expansão dos mecanismos de controlo de antecedentes e análise das redes sociais dos candidatos. Esta nova política poderá atrasar significativamente o processamento de vistos, impactando milhares de jovens que pretendiam iniciar ou dar continuidade aos seus estudos nos EUA.
A situação tem causado inquietação noutras partes do mundo. A Universidade de Ciência e Tecnologia de Hong Kong foi uma das primeiras instituições internacionais a reagir, oferecendo condições especiais de admissão e apoio académico aos estudantes afectados, com o intuito de atrair talentos internacionais que se sintam rejeitados pelo sistema norte-americano.
A crise teve início em Abril, quando a Administração Trump acusou Harvard de fomentar ideologias liberais e de não combater com suficiente rigor alegadas manifestações de antissemitismo no campus. Como represália, a Casa Branca congelou 2,2 mil milhões de dólares em subsídios à universidade e ameaça cortar até 9 mil milhões em apoios federais.
Para os estudantes africanos, muitos dos quais dependem de bolsas e apoios para estudar nos EUA, a incerteza é agora total. A crise levanta sérias questões sobre o futuro da mobilidade académica internacional e sobre o impacto de decisões políticas sobre instituições que, até aqui, eram vistas como bastiões da liberdade académica e da inclusão global.