Quando é que começou a sua carreira na arte de representar?
A minha carreira começa em 1989. Estava a fazer o serviço militar em Portugal e fugia da formatura, na hora do almoço, para ensaiar teatro. Foi assim que tudo começou, com uma grande mulher do teatro e da dança que, no fundo, introduziu dança moderna em Portugal. Uma senhora que se chama Ágata Cena. Foi com ela que comecei a primeira peça teatral, em 1989, que se chamava “Que vergonha Dona Berta”. Era jovem. Fizemos a peça nos Bombeiros Voluntários de Carnaxide. Depois fomos para os Bombeiros Voluntários da Cruz Quebrada, mais tarde para Tercena e Barcarena. Isto foi o início de tudo.
Fala com um brilho no olhar. É um brilho de saudade?
Foi muito engraçado, por isso lembro-me bem. Toda a circunstância de fugir da tropa e ir ensaiar teatro é o começo da minha vida no palco. Aliás, antes disso, tinha uma banda. Cantava na banda da escola, que era uma banda Jazz, pois fiz a Escola Alemã de Lisboa e era o vocalista da banda. Depois tivemos uma banda rock, que eram os Confundidos. O baterista ainda trabalha muito hoje em dia, faz muita sonoplastia para o teatro. Chama-se André Pires, que ficou padrinho da minha primeira filha. O Manuel Wiborg, que é um actor muito conhecido, cantava comigo, isso em 1998.
Um jovem feito para as artes.
Sim! No mesmo ano, faço as audições para entrar na Escola Superior de Teatro e Cinema de Lisboa e entrei. Aí, sim, começa a minha carreira. Logo no primeiro ano faço a Banqueira do Povo, que foi a minha primeira novela. Fiz o personagem António, deu até para comprar o meu primeiro carro, era um Renault 4.
E qual foi a última vez que representou como autor?
A última vez que representei foi há três meses. Num filme feito por uma cadeia alemã, a ZDF. O filme chama-se “Fuga de Lisboa” um filme em alemão. Foi a primeira vez que eu representei na língua que me viu nascer, porque nasci na Alemanha, os meus pais estavam lá a estudar. O filme vai sair em Dezembro pela ZDF. É um telefilme que só vai ser exibido na Alemanha. Felizmente não estou só agarrado ao mundo lusófono, mas num mundo maior.
Já há algum tempo que não representa aqui no país, foi mais para o backstage [bastidores]. O que se passou?
Na verdade, sempre estive no backstage, desde que fundei o meu grupo, em 1998. Mas aqui foi porque a produção diminuiu, com a saída da Semba Comunicações de cena. Ficamos sete anos parados sem fazer nada. A Covid apareceu para a ajudar e depois as produções explodiram. Tivemos vários eventos a incentivar a produção, como o Unitel Angola Move, assim como a Diamond Films, que entrou com muita força na produção. Mas a minha presença no backstage tem também um pouco a ver com a minha doença, vitiligo, que me atacou bastante. Na altura, ainda estávamos a fazer a novela Jikulumessu.
Sofreu alguma discriminação para interpretar algum personagem?
Sim, perdi vários papéis, alguns deixei de fazer por conta da doença, porque não interessava em termos estéticos. Quando é assim só temos de sacudir e tentar fazer outra coisa. A discriminação já é a minha alcunha. Nasci na Alemanha, onde fui sempre discriminado, e vim para África, onde também fui sempre discriminado. Na Alemanha era o preto e aqui era o alemão.
E quando é que despertou para a escrita no cinema?
Fui fundador do primeiro grupo de teatro, em 1998, Grupo Teatral Pau Preto, que era só com actores africanos em Portugal. Nós escrevíamos as nossas peças e, na altura, era o encenador. Encenei todas as peças desse grupo. O sonoplasta era o André Pires, que era o único português no grupo, o resto eram angolanos, cabo-verdianos e moçambicanos, na sua maioria.
Esta escolha de actores africanos foi acidental ou propositada?
Não foi um acidente de percurso, foi uma escolha em absoluto.
Via: Expansão