
As viagens ao exterior, que deveriam ser momentos de representação institucional e diplomática dos interesses nacionais, tornaram-se, segundo denúncias internas, verdadeiras oportunidades para deputados encherem os bolsos com ajudas de custo elevadas que chegam a atingir até 2 mil dólares por dia.
Fontes parlamentares ouvidas pelo jornal *Valor Económico* revelam que, em média, os parlamentares que viajam para missões no estrangeiro por um período de seis dias recebem cerca de 8 mil dólares em ajudas de custo. O valor diário varia entre 1.300 e 2 mil dólares, com a média real rondando os 1.600 dólares, uma vez que os dias de partida e regresso também contam para o pagamento.
“Na prática, o deputado fica no país de destino quatro ou cinco dias úteis, o resto são apenas dias de trânsito. É muito dinheiro, e apesar de eu também já ter beneficiado, entendo que é uma situação que não pode continuar assim”, confidenciou um deputado de uma das duas maiores bancadas do Parlamento, referindo que o privilégio é generalizado e não se limita ao MPLA. “Os da oposição também, incluindo os da UNITA, beneficiam da mesma forma”, acrescentou.
Mais grave ainda é o facto de, segundo as fontes, a escolha de quem viaja com mais frequência não se basear em critérios de mérito ou representatividade, mas sim na proximidade com os decisores. “Há quem viaje quase sempre que surge uma missão internacional. É uma espécie de grupo fixo. Por exemplo, no grupo parlamentar que acompanha a CPLP, há membros que estão sempre incluídos nas delegações. O mesmo padrão repete-se noutros grupos de trabalho”, destacou a fonte.
Apesar das confirmações vindas de dentro do próprio Parlamento, uma fonte ligada à Secretaria da Assembleia Nacional desvalorizou as denúncias, classificando-as como “falsas e sem fundamento”.
Outra questão levantada pelos parlamentares é a contratação de um seguro de saúde, que, apesar de ser uma vantagem para os deputados, está a ser alvo de críticas quanto à escolha da seguradora. Alguns parlamentares questionam a transparência do processo e a qualidade do serviço prestado pela empresa seleccionada.
As denúncias surgem num momento em que a população enfrenta dificuldades económicas severas e em que o discurso da austeridade ainda é utilizado como argumento para justificar cortes em sectores essenciais. As revelações lançam mais um balde de água fria sobre a imagem do Parlamento, num contexto em que cresce o descrédito da classe política junto da sociedade civil.
Diante da indignação popular, cresce a expectativa de que haja um posicionamento firme das autoridades competentes e, sobretudo, uma revisão profunda nos critérios e montantes das ajudas de custo, para garantir maior equidade, transparência e responsabilidade no uso dos fundos públicos.