
Num aparente paradoxo, Angola registou uma perda de mais de 100 mil empregos formais no primeiro trimestre de 2025, mas viu a taxa de desemprego cair para o nível mais baixo dos últimos cinco anos. Especialistas alertam: o cenário real pode estar a ser mascarado por mudanças estatísticas e uma migração silenciosa para o trabalho informal e a inactividade.
De acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), analisados pelo semanário Expansão, o país perdeu 102.899 empregos formais entre dezembro de 2024 e março de 2025. No entanto, o número total de empregos cresceu graças à criação de mais de 335 mil postos na economia informal, resultando num saldo positivo de 232.280 empregos.
À primeira vista, os números parecem encorajadores: a taxa oficial de desemprego desceu de 30,4% para 29,4%, atingindo o valor mais baixo desde 2019. Mas a leitura técnica levanta dúvidas. O recuo no desemprego foi, em parte, influenciado por uma redução de quase 161 mil pessoas na população desempregada, acompanhada de um aumento de mais de 159 mil na população inactiva — um grupo que deixou de procurar emprego e que, por isso, deixa de contar como desempregado.
Ou seja, milhares de angolanos podem não estar a trabalhar nem a procurar emprego, mas já não aparecem nas estatísticas de desemprego. Para alguns economistas, isso pode distorcer a leitura da realidade económica do país.
“Este tipo de movimentação pode criar uma ilusão de progresso no combate ao desemprego”, defende um analista ouvido sob anonimato. “Se as pessoas deixam de procurar trabalho por desmotivação ou falta de oportunidades reais, não é porque o problema desapareceu — ele apenas desaparece dos gráficos.”
Segundo os critérios do INE, uma pessoa com “emprego” pode ser alguém que tenha trabalhado pelo menos uma hora nos sete dias anteriores ao inquérito, desde que tenha recebido uma forma de compensação, em dinheiro ou em espécie. Críticos argumentam que, num país com elevados níveis de pobreza e informalidade, essa definição pode ser enganadora.
Ao todo, Angola tem 18,1 milhões de pessoas em idade activa, das quais cerca de 5,3 milhões continuam desempregadas. No entanto, o verdadeiro impacto das perdas no sector formal e da fragilidade do trabalho informal ainda não é totalmente mensurável.
A informalidade, que avança a passos largos, coloca desafios sérios à proteção social, arrecadação fiscal e estabilidade laboral. E apesar da queda percentual no desemprego, a realidade vivida por milhões de angolanos pouco mudou — ou, como muitos dizem nas ruas, “as estatísticas não pagam o pão”.