
A nova decisão de alguns bancos comerciais em Angola de aplicar uma anuidade sobre cartões de pagamento ligados a contas salariais está a gerar indignação e coloca-os em rota de colisão com os regulamentos do Banco Nacional de Angola (BNA). A medida, liderada pelo Banco Angolano de Investimentos (BAI), prevê cobranças que multiplicam por dez os valores atuais, desafiando diretamente uma norma que há quase uma década proíbe essa prática.
A partir de 28 de abril, clientes do BAI com contas de salário associadas a cartões bancários passarão a pagar 15.000 kwanzas anuais — uma subida drástica face aos 1.500 kwanzas anteriormente cobrados. A decisão levanta sérias questões legais, já que o Aviso n.º 03/2018 do BNA estabelece claramente a proibição da cobrança de taxas de emissão, reemissão, anuidade ou utilização quando os cartões estão vinculados a contas de crédito salarial.
Especialistas alertam que esta situação representa mais do que uma violação administrativa — é um retrocesso nas políticas de inclusão financeira. Com apenas cerca de 30% da população com conta bancária, medidas como esta podem afastar ainda mais os angolanos do sistema financeiro formal.
“O objectivo dos serviços mínimos bancários é garantir acesso básico e gratuito à população de baixos rendimentos”, explicou Marília de Fátima Poças, administradora executiva do BNA, durante a última conferência do Comité de Política Monetária. A responsável foi clara ao afirmar que a supervisão comportamental da instituição está a acompanhar as reclamações e não descarta tomar medidas corretivas contra os bancos infratores.
Apesar das penalizações previstas por lei — que podem variar entre 1,5 milhões e 500 milhões de kwanzas, dependendo da gravidade da infração —, fontes do setor admitem que para alguns bancos compensa mais arriscar a coima do que abdicar da receita gerada com as taxas.
Para os consumidores, resta o recurso formal junto do BNA. A entidade apela a todos os cidadãos lesados que apresentem queixa para que cada caso possa ser analisado e eventualmente sancionado. A medida é vista como um teste à autoridade do banco central e ao compromisso do sistema financeiro com a inclusão, a transparência e o respeito pelos regulamentos vigentes.
Num país onde o acesso à banca ainda é um privilégio para poucos, a cobrança de taxas abusivas nos cartões salariais pode ser vista como um passo atrás — e a resposta do BNA pode definir se as regras continuam a ser meras recomendações ou leis com consequências reais.