
Um novo relatório da Associação CEDESA, que será publicado esta semana, lança uma reflexão ousada e provocadora sobre o actual panorama político angolano: o direito a governar, durante décadas associado ao MPLA, “perdeu a sua validade”. A análise marca um ponto de ruptura com a lógica histórica do poder em Angola e sublinha que o país está a viver uma mudança estrutural profunda, impulsionada pela emergência de uma nova consciência cívica e fiscal entre os cidadãos.
De acordo com a CEDESA — um centro de investigação composto por académicos da Angola Research Network —, esta transformação advém do crescente número de contribuintes angolanos, que ao sustentarem o Estado com os seus impostos, exigem agora uma maior proximidade entre governantes e governados. “A relação entre a contribuição fiscal dos cidadãos e a capacidade do Estado de funcionar tornou-se um elemento central na dinâmica política do país, ultrapassando ideologias e manifestações públicas”, afirma o relatório.
O documento sustenta que, historicamente, o poder político se sustentou na legitimidade da vitória militar na guerra civil e nos lucros do petróleo. Contudo, o contexto mudou: com a retirada progressiva dos subsídios aos combustíveis — por orientação do FMI — e o alargamento da base tributária, o Estado passou a depender directamente do bolso dos cidadãos. “No passado, o Estado não precisava do povo para financiar-se, agora precisa”, alerta a Cedesa.
Com mais de 5,5 milhões de pessoas registadas como contribuintes e cerca de 14 milhões com potencial para sê-lo, a análise aponta para um novo contrato social em construção, assente na responsabilização mútua e na exigência de resultados concretos. O relatório recorda que, ao longo da História, o pagamento de impostos tem servido como catalisador de grandes transformações políticas e democráticas — e Angola poderá estar a caminhar nesse sentido.
Outro dado relevante: mais de dois terços da população angolana têm menos de 25 anos, e, por isso, não guardam memória da guerra civil nem da luta pela independência. Para esta geração, a legitimidade histórica do MPLA perdeu força simbólica, não bastando ter vencido a guerra para justificar a permanência no poder.
“Se o poder político precisa do povo, então o povo vai participar no poder político”, conclui a Cedesa, apontando para