A maioria dos angolanos, cerca de 57%, já pensou em deixar o país, principalmente devido às dificuldades económicas que os forçam a procurar melhores oportunidades. A Europa surge como o destino preferido dos potenciais emigrantes, conforme revela um estudo recente do Afrobarómetro, publicado na semana passada. O levantamento foi realizado com uma amostra nacionalmente representativa de 1.200 cidadãos adultos, entrevistados entre março e abril deste ano.
O estudo destacou um dado curioso: muitos dos jovens angolanos com algum poderio económico estão entre aqueles que mais desejam emigrar. Estes jovens, com educação e algum recurso financeiro, são considerados os mais necessários para o desenvolvimento do país, mas são justamente os que estão mais inclinados a procurar oportunidades fora.
Amândio Carvalho, de 45 anos, é um exemplo típico. Atualmente desempregado e com problemas sociais, ele aguarda um apoio prometido pelos familiares para deixar Angola e seguir para Portugal, onde a comunidade angolana é uma das maiores, com cerca de 56 mil cidadãos. Carvalho explica sua decisão: “É uma oportunidade que os meus irmãos estão a abrir para mim. Aqui estou desempregado, com alguns problemas sociais, e penso principalmente nos meus filhos. Quero arranjar um futuro melhor para eles.”
Embora Carvalho não faça parte do grupo mencionado pelo sociólogo David Boio, do Afrobarómetro, ele representa a realidade de muitos angolanos que, mesmo com alguma educação e recursos, preferem emigrar em busca de melhores condições de vida. Boio ressalta que esses são os jovens que mais poderiam contribuir para o desenvolvimento de Angola, mas são justamente eles que, em busca de melhores condições, acabam deixando o país. O sociólogo destaca que, por exemplo, em Portugal, a comunidade angolana tem crescido significativamente, já sendo superada apenas pela comunidade brasileira.
De acordo com o estudo, com nível de confiança de 95% e margem de erro de 3%, os homens são os que mais demonstram o desejo de emigrar, representando 60% dos potenciais emigrantes. Além da Europa, América do Norte e África do Sul também são destinos frequentes entre os angolanos que consideram deixar o país.
O líder da Associação Juvenil para a Solidariedade (AJS), Júlio Lofa, alerta que as políticas públicas ineficazes estão a empurrar milhares de jovens para a indigência, dificultando ainda mais a permanência de muitos no país. “O desemprego afeta a maior parte da população angolana, e a maior parte é jovem. Muitos desses jovens nem sequer sabem que poderiam melhorar suas condições fora do país. Outros, que já estão na indigência, estão saindo todos os dias”, afirmou Lofa.
Carlos Gonçalves, ex-jornalista da Rádio Nacional de Angola, que vive em Portugal há alguns anos, também acredita que a tendência de emigração vai continuar. Ele observa que a desvalorização da moeda e o desacerto das políticas económicas do governo de João Lourenço fragilizaram ainda mais a sociedade, gerando desconfiança e levando muitos a procurar uma vida melhor em outros países.
No entanto, o governo angolano tem tentado reverter esse quadro. Em agosto, foi lançado um fundo de 500 milhões de dólares para apoiar o emprego juvenil por meio de projetos públicos e privados. Apesar disso, a persistente falta de emprego e a frustração com as políticas econômicas continuam a ser um forte motivador para a emigração em massa.
O estudo do Afrobarómetro, realizado com base em uma análise de dados de qualidade e representatividade, revela que, apesar dos esforços governamentais, a situação económica continua a ser um grande desafio para o governo de João Lourenço, que enfrentou críticas pela gestão da economia e da democracia durante seu mandato.